sexta-feira, 19 de agosto de 2016

ela e o outro












ele pensou que dizendo-lhe que a amava faria nascer o amor dentro dela. como num livro de auto-ajuda que nos aconselha a dizer em frente ao espelho 'eu amo-te', e passado algum tempo, a nossa auto-estima aumenta. 

mas não, ela não era um espelho, a vida não é um livro de auto-ajuda, e ela já tantas vezes lhe tinha dito que não a chamasse de princesa, nem de bela, nem de amor. que a chamasse pelo nome. 
ela gostava tanto de ouvir o seu nome... 
mas ele continuou. dizia que a amava, com diferentes formas de dizer, e ela a ver-lhe nos olhos, a ouvir-lhe na voz, aquela tentativa de a convencer, de se convencer. 
ela a ver nele e a ouvir nas suas palavras, o que ele não mostrava nem dizia.

então ele cansou-se de esperar que ela retribuísse as palavras de amor, que ela lhe dissesse 'eu também' para as saudades, para os sentimentos, para os desejos. 
ela não espelhou, e amar, não é sentir que se esforce, pensava ela.

então o cordão quebrou-se.

ela respirou fundo. 
regressava novamente a ela, sem expectativas, livre para ser aquela bola pinchona, que tanto está lá no alto como cai a pique, sem ter que explicar porquê. 
livre para fraquejar, se o cansaço for muito, livre para ser ela, para pousar o seu corpo num banco de jardim, e deixar os olhos perderem-se no rio. 

ele seguiu caminho em busca de outro espelho que reflectisse o grande conceito que tem de si mesmo, alguém que pela insatisfação, procurasse patamares mais altos para atingir. 
ele nunca se contentaria com o banco de jardim nem nunca perceberá que ela se espelha, mas é no rio, eternamente enamorado do mar.

ele encontrará um outro amor que gostará que lhe chame princesa e todos os nomes que não o dela.

ela, continuará, com os olhos fitos no ponto em que o rio se une com o mar.